
“Quem aconselha Bolsonaro a furar o teto o leva para uma zona de impeachment.” (Paulo Guedes, em 11 de agosto de 2020).
Está começando a acontecer o que já era previsto e nem precisava alguém ser pitonisa para prever: Paulo Guedes começa a dar sinais claros de que não irá durar muito tempo no governo. O mesmo que se falava de Sérgio Moro. No caso de Guedes, que já admitiu uma “debandada” em seu Ministério com a saída, ontem, de mais dois de seus mais importantes assessores (até agora já foram oito), o motivo principal é o tal “teto de gastos”. Paulo Guedes, o neoliberal que quer vender o Brasil e já declarou que por ele venderia “a porra” do Banco do Brasil, é favorável à venda de todas as estatais. Mas Guedes também quer apertar o torniquete nos gastos públicos e insiste que Bolsonaro deve respeitar o teto, sob risco de entrar no que ele chamou de “zona de impeachment“.
Porém, a cartilha ultraliberal de Guedes se choca com a campanha eleitoral de Bolsonaro. Bolsonaro, que só pensa em 2022, quer ampliar o auxílio emergencial e criar programas sociais, especialmente para entrar politicamente na região Nordeste (reduto em que foi repelido nas urnas) e, para isso, precisa gastar mais do que o orçamento prevê. E também, mais do que o teto de gastos prevê. A reeleição de Bolsonaro passa pela reversão de sua popularidade no Nordeste e ele já deu todos os sinais de que está disposto a abrir o cofre e jogar fora o “torniquete de Chicago” e o próprio Posto Ipiranga.
Paulo Guedes tem um aliado fora do governo: Rodrigo Maia, aquele que disse que não viu nenhum crime cometido pelo governo Bolsonaro. Mas furar o teto de gastos, para um liberal de direita como Maia, seria sim considerado um crime. E aí ele poderia, finalmente, colocar Bolsonaro na tal “zona” à qual se referiu Paulo Guedes. E é aí que entra a aliança de Bolsonaro com o “Centrão”: mesmo furando o teto de gastos, o que seria crime de responsabilidade, os votos daquele grupo que o próprio Bolsonaro já chamou de “o que tem de pior na política”, poderiam garanti-lo no cargo. E nunca é demais lembrar que em 2016, quando o golpista Michel Temer propôs a PEC do teto dos gastos públicos, Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro, então deputados federais, votaram a favor.
Não há dúvida de que agora está claro que Guedes, a exemplo de Moro, também foi usado por Bolsonaro e, pelo visto, começa a ser descartado. A tal “debandada” já é um sinal. Enquanto Moro foi usado para atrair votos de lavajatistas e “moralistas” da classe média, Guedes foi usado para a atrair os votos do mercado. Nos dois casos, ficou claro o que ambos sentiram na pele: a atração virou traição. Se, em certo momento, Moro tornou-se um estorvo para Bolsonaro, agora tudo leva a crer que a pedra no caminho é o Posto Ipiranga, que vai sendo assado lentamente igual costela na brasa. Azar de quem acreditou em “mitos”.
Resta saber se com esse Congresso, caso Bolsonaro fure mesmo o teto, a casa venha mesmo a cair. E também, mesmo com Maia vendo crime, se ele teria coragem de aceitar o pedido de impedimento.