Não é preciso conhecer muito o Bolsonaro para sabermos que ele é fraco, sob todos os aspectos. Defenestrado do Exército, fracassou como militar (o próprio Geisel já dizia). Baixo clero na Câmara teve, em 26 anos, apenas dois projetos aprovados e jamais teve qualquer influência nas grandes decisões da Casa. Assim, também fracassou como deputado. E, como Presidente da República, não precisa nem de oposição: ele e seu governo são autofágicos.
Sabemos que Bolsonaro é intelectualmente tosco e tacanho. É inculto. Tem dificuldades para se pronunciar e mal consegue ler um discurso. Para quem só fala em “Deus”, “família” e “Brasil”, ter que escrever essas palavras na mão durante um debate, mostra a sua desqualificação para qualquer embate retórico. Um aluno mediano de ensino médio o engole fácil em qualquer debate. Talvez por isso ele odeie tanto os artistas, os cientistas, as universidades, os intelectuais, os professores. Mas não é possível que Bolsonaro seja tão imbecil a ponto de fazer o que está fazendo, ou seja, implodindo o seu próprio governo. Em menos de um ano, depois de ver inimigos por toda parte, agora chegou a vez do próprio partido que o elegeu. O PSL é a “bola da vez”. Isso sem falar dos até pouco tempo aliados que já debandaram. Mas agora, é o próprio partido pelo qual foi eleito. O que poderá estar por trás disso?
Até então, os “inimigos do Brasil” e de seu governo eram outros: as universidades, que fazem “balbúrdia”; os professores, que são “doutrinadores”; os artistas, que são “depravados”; os sindicalistas, que são “vagabundos”; os ambientalistas, que são “conspiradores”; os oposicionistas, que são “esquerdopatas”; a imprensa, que é “canalha”; a OAB, que é “comunista”. Mas também o Congresso, o STF (que seus seguidores dizem ter que ser fechado) e o Poder Judiciário como um todo, as ONGs, os cientistas… Todos conspiram contra o governo. Recentemente, em um discurso, Bolsonaro afirmou que “a ameaça interna é maior do que a externa”, resgatando a velha e nada saudosa doutrina de segurança nacional: os inimigos estão aqui. Cabe combatê-los!
Mas agora, o próprio PSL entrou na lista dos inimigos e isso, na lógica bolsonarista, pode estender-se a todos os partidos. Até porque Bolsonaro nunca foi de partido. Passou por uns 10, sem rigorosamente ser de nenhum. Então, quando o seu próprio partido vira inimigo “e não o deixa governar”, imagine os outros. Logo, todos são inimigos.
O que tudo isso pode significar? A “bolha bolsonarista” ainda está em plena atividade. Embora “milicianos virtuais”, eles são reais e atuam nas redes sociais combatendo todos os supostos “inimigos”. Não seria tudo isso uma estratégia para justificar futuras ações? E não deixa de ser uma coincidência quando tudo isso acontece justamente no exato momento em que o STF inicia o julgamento da prisão em segunda instância. Justamente no exato momento em que, mais uma vez, o general Villas Boas faz uma ameaça velada ao Supremo, via Twitter. Justamente no exato momento em que Jair Bolsonaro, finalmente, desiste de indicar o seu filho para embaixador nos EUA. Traduzindo para a linguagem bolsonarista: “Os inimigos não me deixam governar, o STF quer soltar bandidos, um traidor desonesto me grampeou e até o meu filho eu não pude indicar como embaixador”. Fiquemos atentos. Parece haver um “remake” de um filme que já vimos. E talvez precisemos até da união da esquerda com a direita para manter a democracia. Porque a democracia precisa da direita. A democracia precisa da esquerda. A democracia precisa do centro. O fascismo, no entanto, é completamente desprezível.