“Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
Pai, afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue…” (Chico Buarque, Cálice, 1973).
O momento que o Brasil vive é tão nebuloso que já houve quem dissesse que estamos até começando a perder a dignidade. Chegamos a uma situação de ficarmos aliviados com declarações do vice Hamílton Mourão, quando o general desmente e corrige as atrocidades vomitadas dia sim, dia também, por Bolsonaro. E agora, chegamos ao ponto de termos que defender a liberdade de expressão de sites de ultra-direita, como “O Antagonista” e a revista “Crusoé”. Só para se ter uma ideia, o grande “protagonista” do “Antagonista” é ninguém menos que Diogo Mainardi, um “lavajateiro” convicto e radical. Radical? Nem tanto. Ele é “lavajateiro” mas apoiou o Alckmin em 2006. Ele é “lavajateiro” mas apoiou o Aécio em 2014. Como muitos que conhecemos. Deu para entender?
Agora, o STF, que vem sofrendo ameaças fascistas e até desteminas, como da “ex-temerosa” Regina Duarte, através de um conluio do ministro Alexandre de Moraes com o Presidente Dias Toffoli, impôs a censura aos veículos do Diogo Mainardi. Só porque o site “O Antagonista” publicou um e-mail da Odebrecht onde é citado um tal “amigo do amigo do meu pai”. Parece que esse “amigo do amigo do pai” é o próprio dias Toffoli. Então, em nome da “autoridade” e do “respeito” ao Supremo, Tóffoli, em conluio com Alexandre de Moraes, exigiu que a matéria publicada fosse retirada do ar. Só que para outro ministro, o decano Celso de Mello, é o próprio Supremo que perde o respeito ao impor a censura. A máxima atribuída a Voltaire (há contestações) que afirma “discordo do que você diz, mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo”, que remonta a um tempo obscurantista, nunca foi tão propícia ao momento do país. Em nossa cruzada vamos, pouco a pouco, perdendo nossa dignidade. Ora defendendo Mourão. Ora defendendo a liberdade de expressão e o direito de “lavajateiros” como Mainardi de publicar suas matérias.
Agora, o rolo se desfez e a censura foi suprimida. Moraes teve que voltar atrás. Não por vontade de Toffoli/Moraes, mas pela pressão dos próprios pares da Suprema Corte. Foi uma vergonha. O STF, seja de forma monocrática ou colegiada vem, há tempos, rasgando o artigo constitucional que é o coração da liberdade, o artigo 5º, de quem a Corte deveria ser a guardiã. Primeiro foi em relação à prisão em segunda instância. Agora, com a censura.
O argumento de Toffoli, que falou em limites e respeito ao Supremo, o deixa mais ainda no vácuo. Porque quando o STF foi achincalhado até pelo filho do Bolsonaro ele colocou a toga entre as pernas. Talvez com medo do cabo e do soldado. Então, cercou-se de um general. O quadro é mesmo nebuloso. Hoje estamos exigindo a liberdade de expressão para Diogo Mainardi.
Mas o ardil de Toffoli/Alexandre de Moraes parece que fez o tiro sair pela culatra. O Supremo acaba de autorizar Lula a dar entrevistas na prisão. A Folha de São Paulo e o Antagonista devem ter os mesmos direitos de publicar o que desejarem.
Agora, que Toffoli e Moraes engulam a própria lambança que fizeram. Até o Bolsonaro tirou uma “casquinha” da lambança e, por incrível que pareça, defendeu a liberdade de expressão e a imprensa. Toffoli, como Presidente do STF, está parecendo até um daqueles deputados neófitos do PSL e sendo engolido por raposas rodadas e felpudas. E que o Fux também aprenda com esse episódio. Porém, não nos iludamos. Porque dentro do Kinder Ovo sempre haverá uma surpresa.